"Vou à Bahia porque, se alguém fez o impossível para eu sair do país, foi Dado Galvão. Desde que filmou uma entrevista comigo em Havana, ele tem sido incansável. Mesmo quando me faltava esperança, ele a mantinha" YOANI SÁNCHEZ - FOLHA DE SÃO PAULO

Em vídeo, blogueira cubana pede ajuda a Dilma para vir ao Brasil



Yoani Sánchez tenta, pela quinta vez, permissão do governo de Cuba para vir ao Brasil

Dilma Rousseff, “por favor, interceda por mim. Já fiz tudo o que está a meu alcance. [Mas] o muro do controle, o muro da censura, o muro que me impede de viajar livremente e retornar à minha ilha parece não se mover. Ajude-me, por favor”.

A jornalista, blogueira e ativista cubana Yoani Sánchez, uma das vozes críticas ao governo de Cuba mais atuante nos últimos anos, gravou um vídeo de apelo à presidente brasileira Dilma Rousseff. Na gravação, obtida com exclusividade pelo R7, Yoani pede à Dilma que a ajude a visitar o Brasil, algo que a cubana vem tentando, sem sucesso, desde meados de 2010.

Isso acontece porque uma lei de migração da ilha obriga todo cubano que pretenda ir ao exterior a pedir uma permissão antes da viagem. Desde 2008, Yoani entrou com 18 pedidos de liberação para diversos países, mas todos foram negados. Desse total, quatro eram para o Brasil.

Yoani espera agora por um novo convite vindo do Brasil, e que deve ser enviado a Havana pela Embaixada de Cuba em Brasília, para entrar com seu 19º pedido de viagem ao exterior. Em entrevista por telefone ao R7, a ativista diz que “este é um triste recorde que eu não gostaria de ter”.

- Se não houver uma intervenção de um nível mais alto, provavelmente esta será a 19ª negativa.

Leia a entrevista completa de Yoani Sánchez

Yoani aguarda o convite enviado pelo documentarista e ativista baiano Cláudio Galvão da Silva, o Dado Galvão. Ele é o autor do documentário Conexão Cuba Honduras, gravado na ilha caribenha e que tem a blogueira como personagem principal, além do movimento Damas de Branco (mulheres de dissidentes políticos cubanos). O documentário narra também a história do jornalista hondurenho Esdras Amado López e seu trabalho para retomar o controle da emissora Canal 36, que sofreu intervenção do então presidente interino Roberto Micheletti após o golpe de Estado de junho de 2009 que derrubou Manuel Zelaya.

Galvão convidou Yoani para visitar a cidade baiana de Jequié, a 365 km de Salvador, onde ocorrerá o lançamento do documentário no próximo dia 10 de fevereiro.

A estréia do filme, que tem uma hora dedicada a Cuba e mais 45 minutos sobre Honduras, já foi adiada duas vezes desde junho de 2010. É desde essa época que Yoani tenta vir ao Brasil para o lançamento (o trailer pode ser visto no site www.dadogalvao.org).
Segundo Galvão, o filme foi adiado das outras vezes em “solidariedade à luta de Yoani”. Além disso, o realizador afirma que, com o adiamento, o filme também ganhou mais conteúdo, já que foram incorporadas as ações de outro personagem importante na “luta de Yoani”: o senador brasileiro Eduardo Suplicy (PT-SP).

- Suplicy comprou a causa e começou a reivindicar [a permissão para Yoani].

Suplicy aguarda por ação de Fernando Collor

O senador paulista é um dos apoiadores da viagem da cubana ao Brasil. Desde 2010, o petista já enviou cartas ao embaixador de Cuba em Brasília, Carlos Rafael Zamora Rodríguez, ao então ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, além também de ter escrito uma carta ao ex-presidente cubano Fidel Casto.

Em todos os documentos (que podem ser visualizados no site de Galvão), Suplicy se classifica como um “amigo de Cuba” e afirma que não faria o pedido se não fosse para o bem da ilha.

A última tentativa de Suplicy foi enviar uma carta, no último dia 15 de dezembro, ao presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional (CRE) do Senado, o senador Fernando Collor de Mello (PTB-AL). O petista quer que a CRE peça, oficialmente, a liberação da blogueira cubana.

O R7 entrou em contato com a CRE e com a Embaixada de Cuba para saber se a carta de Suplicy e o convite de Galvão tinham sido entregues à representação diplomática, mas as duas instituições não confirmaram a informação. Segundo um porta-voz da CRE, quem poderia dar a informação é o secretário da comissão, Álvaro Souza, que está em recesso até 23 de janeiro. Já a embaixada cubana informou que o responsável pelo atendimento à imprensa está de férias em Cuba e que somente ele poderia repassar o atual estágio de todo o trâmite.

Suplicy disse ao R7 que tentou entrar em contato com Collor para saber a situação do documento, mas, até o final da tarde desta terça-feira (3), não tinha conseguido falar com o senador de Alagoas.

“Não me empurrem até uma balsa”

Em meio a esse cenário de incertezas e de vaivém burocrático, Yoani resolveu fazer o vídeo de apelo a Dilma. Em 2010, ela já tinha escrito uma carta a Lula com o mesmo pedido.

No atual vídeo, gravado no dia 28 de dezembro, repassado para Galvão no mesmo dia e legendado pelo próprio documentarista, Yoani diz que tem muitos desejos de conhecer o Brasil, mas afirma que, “lamentavelmente, sou impedida de sair de meu país”.

- Não cometi nenhum crime. [Sou impedida de sair] simplesmente por escrever, narrar minha realidade, fazer um jornalismo crítico.

Yoani então faz um pedido “muito respeitoso, muito humilde”, à presidente brasileira.

- Sei muito bem que ela conhece em carne própria o que é a desproporção de poder entre um governo e um indivíduo. [Dilma conhece] o que é o controle excessivo, a repressão. Então gostaria de apelar precisamente a este conhecimento histórico e pessoal que [a Dilma] tem, de algo parecido com o que estou vivendo, e pedir-lhe, por favor: interceda por mim.

No vídeo, Yoani aparece de costas para o mar. Na entrevista ao R7, ela diz que o local da gravação se encontra na costa oeste de Havana, “um lugar muito importante para os cubanos”.

- Foi neste cenário onde, em 1994, ocorreram saídas massivas de balseiros de Cuba [para fugir do país]. Mas eu não quero que me obriguem a tomar uma balsa. (...) Selecionei este lugar, de maneira simbólica, para dizer “Não quero que me empurrem até uma balsa”. Quero sair e voltar seguindo os processos legais.

O R7 entrou em contato com a assessoria da Presidência, que informou não ter recebido nenhuma solicitação formal de Yoani para a presidente brasileira. Além disso, como Dilma está de férias na Bahia, não foi possível encaminhar a consulta para a presidente. A assessoria também preferiu não fazer nenhum comentário sobre o vídeo de Yoani pois, por se tratar de um apelo feito diretamente a Dilma, somente a presidente poderia comentar o pedido.

Dilma Rousseff deve voltar hoje ou quinta-feira (5) da Base Naval de Aratu, na Bahia, que fica a pouco mais de 350 km de Jequié, a cidadezinha que espera receber a cubana em fevereiro.